Prêmio revela potências femininas do agronegócio

Mulheres deixam de ser um nicho e conquistam locais de destaque e cargos de liderança no setor

Desde 2018, a premiação Mulheres do Agro conta histórias de profissionais promissoras que têm transformado o agro trazendo uma  nova roupagem para o setor. Em sua 4ª edição, mais de 550 mulheres já registraram suas contribuições na premiação e, a cada edição, há um número maior de inscritas. Somente entre 2019 e 2020, houve um aumento de 61% de mulheres participantes. Dentre tantas narrativas inspiradoras, o prêmio idealizado pela Bayer e Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) – que tem o foco de valorizar as mulheres que atuam na agropecuária brasileira – selecionou 11 mulheres que são inovadoras em gestão de propriedades agrícolas e tambémas vencedoras do prêmio como Embaixadoras Mulheres do Agro. Aretuza Negri, Kamila Laila, Mara Motter, Simone Felisbino, Simoni Nihues, Tatiele Ferreira, entre outras, são as inspirações para as inscritas no prêmio. “Como embaixadoras do prêmio, podemos promover uma comunicação real entre as mulheres e divulgar o que elas estão fazendo em suas gestões nas propriedades, além de trocar experiências, o que é muito agregador”, explica Simone Felisbino.

Simone, assim como as outras embaixadoras, desempenha um papel de grande relevância nas entidades que atua. A gestora trabalha em uma empresa privada com foco em pecuária e produção de soja e milho. Para a execução de seu trabalho, prioriza o uso de tecnologia em campo na produção de grãos, por meio de otimização da utilização de recursos naturais.

Mais um exemplo de protagonismo no agronegócio é Aretuza Negri, criadora de conteúdo para as mídias sociais voltada para o público feminino do agro. Com mais de 30 mil seguidores no Instagram, a profissional sempre esteve envolvida com o agronegócio no setor cooperativo, porém, há três anos, Aretuza se dedica somente a engajar mulheres de todo o Brasil por meio do seu conteúdo. Nas publicações, ela discute temas de grande relevância para o meio. Em sua visão, o trabalho no universo digital traduz o que a mulher representa no agro, ou seja, a transformação. “A mulher tem a inovação na sua essência. Ela sempre está em busca de inovar cada vez mais. Estar na internet é alcançar mulheres que jamais poderíamos encontrar por outros meios. O meu trabalho é propagar conhecimento e troca de informações para fortalecer o crescimento de outras mulheres”, comenta.

A sucessão familiar também é um tema colocado em pauta pela premiação Mulheres no Agro. Kamila Laida, Tatiele Dalfior e Simoni Tessaro são mulheres que assumiram as propriedades familiares por necessidades diferentes, mas com o mesmo objetivo: o de aprender com o trabalho já realizado e trazer novas formas de gerir e produzir com base em novas ideias e tecnologias.

“A minha família produz café há mais de 40 anos, mesmo assim eu e minha irmã sempre recebemos incentivo para construirmos carreiras que não fossem voltadas ao agro. Apesar disso, sempre me mantive próxima do agronegócio e, hoje, sou responsável por toda a gestão da propriedade que,apesar de ser um trabalho que demanda tempo e energia, é uma função de extrema importância e que traz muito resultado na produção”, ressalta Tatiele Dalfior.

Assim como Tatiele, Simoni Tessaro está à frente dos negócios da família. Em conjunto com sua mãe e irmã, ela trabalha no setor desde os 12 anos em decorrência do falecimento de seu pai. De acordo com ela, por estarem muito engajadas nas propriedades, as mulheres ficam no anonimato mesmo representando a somatória de mais de 1 milhão no setor. Por meio dessa iniciativa, ela deseja dar voz a essas mulheres.

“Quando o pai e a mãe demonstram amor pelo campo não tem como o filho não ficar na propriedade.  A grande responsabilidade de cuidar da continuidade dos negócios familiares são dos pais, eles são o exemplo e, hoje, como mãe.me coloco nesse papel também. Quando os pais só reclamam eles afastam os filhos do agro, mas quando o amor pelo agronegócio é transmitido, eles passam a enxergar que o agro por ser uma vida diferente e interessante não tem como a sucessão dar errado”, afirma.

Kamilia Laida ainda se encontra no processo de sucessão. Ela descende de seis gerações no agronegócio, sua família trabalha com suinocultura, silvicultura e pecuária de corte. “A mulher tem habilidade de transitar em todas essas esferas da gestão. Nós temos uma visão 360º muitas vezes vindas da própria resiliência e força. Atualmente, passamos de inspiradoras para propulsoras. Por meio do exemplo trazemos muitas pessoas para caminhar conosco e isso é extremamente benéfico para o crescimento do nosso espaço no setor”, diz.

Na opinião das embaixadoras, o prêmio abre novos horizontes para as mulheres dentro do negócio. Para elas, este é o começo de uma mudança promissora.

“Nós trazemos muita criatividade e a grande habilidade de lidar com pessoas faz com que enxerguemos um movimento grande em relação à tecnologia e inovação relacionados à nossa visão aguçada de futuro. Percebo uma grande preocupação das gestoras em melhorar as condições de trabalho e bem-estar dos trabalhadores das fazendas“, comenta Tatiele Dalfior.

Além de lideranças inovadoras e construção de novos caminhos para alcançar este nicho que está em constante crescimento, o prêmio evidencia ações que encorajam mulheres a assumir o agro como profissão e estilo de vida. Mara Motter, de Três Arroios (RS), também sucessora do trabalho de seu pai há 13 anos, atua como produtora de trigo, soja, milho, pecuária bovina e suína. Além disso, está à frente de projetos sociais que incentivam outras mulheres da sua região a assumir o agro em todas as suas vertentes.

“Na minha região o agro é bastante masculinizado apesar de ter muitas mulheres que atuam no setor. Então, procuro sempre quebrar este paradigma motivando outras mulheres a não só trabalhar fazendo a parte operacional, mas a se aventurar na administração e, consequentemente, desenvolver trabalhos inovadores “, pontua Mara.

Liderança Feminina na Coplacana

Mesmo em menor número, as mulheres têm ganhado destaque nas posições de liderança e gestão, inclusive no meio cooperativista. Amanda Schiavinatti, de 33 anos, que é gerente das filiais Coplacana de Catanduva e São José do Rio Preto, diz que as mulheres têm um outro olhar sobre a gestão de negócios e pessoas. “Independentemente de qualquer perfil profissional, sinto que nós temos uma maneira mais empática de enxergar as opiniões e reconhecer talentos, e quando se trata de gestão a empatia, esse envolvimento faz muita diferença na verdadeira liderança”, pontua.

A profissional, que é formada em agronomia e pós graduada em gestão integrada,está na cooperativa há três anos. Iniciou sua trajetória de carreira na Coplacana como agrônoma de campo pela filial de São José do Rio Preto, abrindo carteira de novos cooperados e novos mercados na região de Catanduva e Novo Horizonte. Porém, com o crescimento da demanda na região, gerou a abertura de uma nova unidade na cidade de Catanduva, em março de 2020, a qual assumiu a liderança e, neste ano, a gestora obteve mais um desafio: comandar a unidade de São José Rio Preto.

A gerente conta que a jornada profissional não é fácil, mas acredita que este distanciamento entre os gêneros vai diminuir em breve, já que a mulher traz inovação para o setor por meio da criatividade e olhar cuidadoso para o mercado.

“Sou uma mulher do agro feliz e apaixonada pelo que faço. Apesar de não sentir mais esse preconceito em relação à minha atividade, sei que estamos a caminho da equidade entre proporção de homens e mulheres no agro. No mercado atual do agronegócio ainda somos minoria dentro das companhias. Me inspiro muito e acredito que o grande aumento dos cargos ocupados por mulheres muito em breve se equilibre, afinal não é de hoje que as mulheres exercem funções nos meios da cadeia agrícola, a diferença é que, atualmente, saíram do papel de suporte dos familiares e estão ocupando o lugar de protagonistas”, declara Amanda.

Fora das cooperativas e das empresas também é possível encontrar exemplos de mulheres que têm amor pelo agronegócio. Maria Sidneia Marotto, que atua no agro desde 2005, iniciou sua paixão pelo negócio exercendo algumas atividades agrícolas em sua propriedade durante os finais de semana na década de 1990. O que era somente um hobby passou a ser trabalho sério e ela deixou o trabalho como funcionária pública do Estado de São Paulo para se dedicar integralmente ao agronegócio. Atualmente, é responsável pela parte administrativa de sua propriedade, porém, o seu trabalho vai além das questões trabalhistas. Em sua opinião, a presença feminina no agronegócio tem o poder de trazer melhorias.

“Acredito que as mulheres têm uma missão importante no campo que é ajudar a melhorar as condições de trabalho. Pensar não só no âmbito trabalhista, mas também no bem-estar dos trabalhadores e de suas famílias. Por exemplo, no caso dos funcionários que moram na fazenda é necessário pensar em uma casa que tenha um certo conforto para ele e a sua família e, principalmente, respeitar a liberdade enquanto indivíduo”, diz.

Após mais de uma década envolvida com o agronegócio, Maria Sidneia declara amor pela atividade e pelo campo. Para o futuro, ela pretende passar seus conhecimentos e seu legado para suas próximas gerações, e já prepara filhos e netos para continuar dando vida para a sua paixão pelo agro.

“Os meus filhos têm outras atividades fora do campo, mas já está no planejamento de daqui a 3 anos começar o processo de integração nos negócios da família. Além deles, também queremos que nossos netos façam parte, por isso procuramos incentivar a escolha de cursos dentro da área. É necessário preparar uma nova geração”, comenta.

Futuro feminino no agro

Nem só de mulheres experientes e com carreiras consolidadas é feito o universo do “agro feminino” também podemos encontrar jovens que buscam no agronegócio um caminho para traçar a carreira profissional. Aos 25 anos, Bruna Scotton é engenheira agrônoma formada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz(ESALQ). Apesar de ter nascido em uma família agrícola, a jovem escolheu traçar o seu próprio caminho dentro do agronegócio.

“Me lembro que eu tive a certeza de que queria fazer agronomia quando visitei a ESALQ no primeiro ano do ensino médio. Logo na primeira apresentação da visita, era do curso de engenharia agronômica e fiquei encantada com o mundo de oportunidades que o curso poderia me oferecer e com a possibilidade de aprender a fundo sobre tudo aquilo que eu sempre ajudei minha família a fazer”, completa.

Em um primeiro momento, a escolha do curso não agradou seu pai que acreditava que a filha deveria seguir profissões mais tradicionais como direito ou medicina por achar que a vida no campo é muito sofrida e a remuneração muito baixa. Pautada na opinião do pai, a jovem buscou outras opções de cursos, mas não desistiu do sonho de ser agrônoma e, em 2014, passou na primeira chamada para engenharia agronômica na universidade dos seus sonhos. Atualmente, Bruna trabalha como analista de projetos em uma empresa multinacional e, apesar de estar longe do campo, atua com processos produtivos relacionados ao cultivo da cana-de-açúcar que sempre foi a área de seu interesse. A jovem enxerga que a atuação feminina está em constante crescimento. E segundo esta tendência, ela tem pretensões de assumir os negócios familiares trazendo seu conhecimento e experiências do mundo corporativo e somar com um trabalho que vem sendo desenvolvido pela sua família desde a infância.

“Eu sempre disse que não queria viver às sombras de tudo que o meu pai construiu com o trabalho dele. Quero crescer e me desenvolver pelas minhas próprias pernas, fazer contatos, aprender muito e deixar o meu legado, mas tudo isso está alinhado com o plano de assumir os negócios da minha família”, explica.

Atualmente, as mulheres somam 1 milhão de agentes cooperadores do agronegócio, elas já não são mais um grupo minoritário dentro do setor. De acordo com dados fornecidos pela Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio, a presença feminina no segmento cresceu por volta de 7%. E este movimento ascendente ao longo dos anos tem desmistificado que o setor é apropriado só para homens. Em relação à cadeia produtiva, a ocupação de vagas de trabalho por mulheres saltou de 24,11% para 27,97%, entre 2004 e 2015 na categoria de empregadas com carteira assinada. Dentro deste montante 73% atuam em áreas como plantio, manejo, colheita, manutenção de máquinas e armazenamento dos insumos. Já a porcentagem de 58% corresponde às mulheres que são sócias ou proprietárias de negócios agrícolas. Neste universo, apenas 5% a 10% dos cargos de alta gerência são ocupados por mulheres, conforme levantamento feito pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).